Uma vez um casal procurou um mestre nas montanhas, que era visitado por milhares de pessoas em busca de conselhos para resolver os seus problemas. Depois de esperar em uma fila enorme foi a vez deles. Então, o mestre disse para a mulher falar o que lhe angustiava. Ela desenovelou um carrossel de defeitos do marido, motivo pelo qual o casal já não conseguia viver bem. Ao fim o guru disse-lhe: – você tem razão! E virando-se para o marido lhe acenou que era sua vez. Ele não deixou por menos, descascando o azedume que reinava em seu peito os muitos defeitos de sua esposa. Por fim, o mestre virou para ele e disse-lhe: – você tem razão! A esposa reclamou: – mas como mestre, eu falei sobre os defeitos de meu esposo e o senhor disse-me que eu tinha razão, agora ele fala horrores de mim e o senhor diz que ele tem razão? O guru virou-se para esposa, pensou e falou: – é mesmo você tem razão!
O mundo não acabou, apesar de várias profecias, de várias datas prometidas. Se o mundo não acabou em um piscar de olhos devemos perguntar: será que os conflitos familiares, a crescente concentração de renda, o fracasso econômico da Europa, as catástrofes climáticas do nosso dia-a-dia não seria o começo do fim de um mundo?
Se formos ver a história da humanidade o progresso é regular e lento. O ser humano se instruiu pela força das revoluções morais e sociais, que foram germinando e se infiltrando nas ideias pouco a pouco e o jeito de viver deixou de estar em harmonia com as necessidades que os novos conhecimentos desnudaram. Além disso, de épocas em épocas abalos físicos e sociais antecederam revoluções morais.
O fim do mundo é individual, cada um escolhe viver um novo mundo ou o seu próprio fim. O fim é uma etapa, um acerto de contas com a própria consciência, é o dia do juízo final para começar de novo, para muitos com choros e ranger de dentes. É o fim para aqueles que somente veem a desordem e a confusão momentâneas, que ferem os seus interesses materiais. Preferem a escuridão, focam a dor, o sofrimento, o medo, o drama, a injustiça e o ódio. Essas pessoas estão nervosas, depressivas, doentes e a felicidade para elas só existe em estados de penumbra.
Para aqueloutros que veem a luz, que eleva o pensamento acima de sua própria personalidade, que a fé não é somente para questões religiosas, mas sim a crença em um mundo melhor, apesar das imperfeições humanas. Para estes, é mais fácil perceber as mentiras e as ilusões, entendem com mais facilidade o Criador e a forma como a vida se organiza, desse modo escolhem com lucidez que tipo de realidade desejam vivenciar.
Nós teremos razão pelo nosso ponto de vista, pelo nosso ângulo das coisas, pelo lado que estamos vendo de uma mesma paisagem. E é por isso que o mestre da montanha deu razão ao casal, cada um ao seu modo tinha os motivos próprios para reclamar do outro. Cabe, se quisermos ser felizes, perceber o outro dentro de suas perspectivas, conforme o outro vê o mundo, e assim, em exercício de compaixão, com empatia oferecermos a face do bem, da compreensão, sem ser conivente com o mal, mas desapegados de nossas concepções, permitindo o deslindar do aprendizado, levando-nos ao novo mundo novo que nasce a cada novo dia. Pense nisso, mas pense agora!
Saulo Carvalho é consultor financeiro e organizacional, atuando para oferecer novos significados para viver as virtudes em abundância. Articulista de A Gazeta, escreve neste espaço aos domingos. saulocarvalho@seubolso.com.br ou www.seubolso.com.br.